Giovaníssima!Bravíssima! (Maiores de 18)

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Falar sobre pornografia é sempre algo delicado para mim. Primeiro porque não sou uma consumidora das mais ávidas desse gênero, segundo porque existe uma controvérsia enorme dentro de vertentes feministas com as quais me identifico, que tornam o assunto um tanto espinhoso.

Já havia falado sobre o assunto aqui e tenho ciência do quanto a pornografia tem sua parcela de culpa quando falamos de cultura do estupro e tudo que isso envolve, desde de disfunções sexuais a violência e tráfico de mulheres. Também sei que não falar sobre isso não vai ajudar a diminuir a violência contra a mulher, assim como as pessoas não deixarão de manifestar seus desejos ou de consumir o que quer que seja que as excitem sexualmente.

Isto posto, Giovaníssima, da italiana Giovanna Casotto – lançada em 2016 pela Veneta – é uma obra Pornográfica com “P” maiúsculo mesmo, como Marie Declerq descreve no prefácio da HQ. Não é erótica, no sentido mais comum do conceito que diz que erotismo insinua, enquanto a pornografia mostra, é gráfica, hiper-realista (com direito a pelos onde as brasileiras não costumam manter!) e Giovanna não tem o menor problema com isso.

A HQ, que tem 104 páginas e foi lançada no Brasil em capa dura,  é uma coleção de histórias curtas e lindamente ilustradas, misturando imagens preto e branco com itens coloridos. O traço realista da artista é tão impressionante que a sensação é de olhar uma fotografia, tamanha é a riqueza de detalhes. Detalhes estes que são capturados de maneira muito curiosa: na falta de modelos para se inspirar, Giovanna usa sua própria imagem para criar suas personagens.

Detalhe do traço de Giovanna na exposição Comics, que paixão, realizada em 2016

Quem esteve na exposição dedicada aos quadrinistas italianos da Gibiteca Henfil, em SP, pode conferir de pertinho a exuberância do trabalho da artista. Eu fui uma dessas pessoas, hehe!

As histórias têm sempre uma pitada de humor e isso não faz delas menos excitantes, muito pelo contrário. Cada uma explora fantasias bem conhecidas de muitas mulheres e as coloca como protagonistas de toda a ação, como se no fim das contas, cada uma delas soubesse exatamente o poder que tem e usasse isso para dominar, não no sentido masoquista da coisa, o seu parceiro ou parceira.

Se engana quem pensa que há por traz das narrativas alguma intenção feminista, até porque Giovanna mesmo não se enxerga assim. Vale a pena dar uma olhada na entrevista que ela concedeu às Minas Nerds (e que tive o prazer de traduzir) para amplificar essa experiência. Giovanna parece ser, acima de tudo, uma pessoa gostosa, no sentido de você poder passar horas conversando sobre o que quer que seja, sem perceber o tempo passar. Ela não tem nada a ver com suas personagens, além da aparência (o que por si só, já é incrível), afinal, teria que dispor de muito tempo e energia pra realizar metade do que são na verdade, fantasias. Giovanna gosta mesmo é de tricotar!

Mas voltando aos quadrinhos, quem curte o gênero e se acostumou com as obras de mestres como Manara e Crepax, também vai se apaixonar pelo traço dessa italiana. Como mulher, é inegável que Giovaníssima me ofereça uma perspectiva mais próxima do que eu considero sexy, afinal, o nível de violência contido nas obras consideradas clássicas da pornografia em quadrinhos, não me apetece, o que já não acontece com o trabalho da Giovanna.

Ainda que a narrativa dê o tom de safadeza e brincadeira em cada história, seus quadrinhos poderiam facilmente dispensar os balões, pois vamos combinar, que quando se trata de pornografia, a imagem precisa ter um apelo muito maior do que as palavras, não é mesmo?

Mesmo assim, é impossível não se divertir com as aventuras mirabolantes de uma matadora de aluguel que seduz suas vítimas, mãe e filha, para realizar o seu trabalho. Como não torcer por ela na piada clássica do marido que, não realizando os pequenos serviços domésticos como uma troca de lâmpadas, faz com que a esposa se veja obrigada a transar com o filho do zelador em troca de assistência técnica?

São piadas infames, histórias em tom de besteirol, ilustradas com imagens extremamente picantes e gráficas que eu duvido que alguém consiga ficar indiferente. É um álbum feito pra que o leitor literalmente goze de momentos de prazer, sem se preocupar com convenções, moral, pudores ou correntes filosóficas. Isso fica pra uma outra hora. Por agora eu apenas recomendo que você confira Giovaníssima e tire suas próprias conclusões. E claro, me conte depois o que achou!

 

Dani Marino

Dani Marino é pesquisadora de Quadrinhos, integrante do Observatório de Quadrinhos da ECA/USP e da Associação de Pesquisadores em Arte Sequencial - ASPAS. Formada em Letras, com habilitação Português/Inglês, atualmente cursa o Mestrado em Comunicação na Escola de Artes e Comunicação da USP. Também colabora com outros sites de cultura pop e quadrinhos como o Minas Nerds, Quadro-a-Quadro, entre outros.

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