Resenha dos Clássicos: Tropa de Elite I – Parte 2/2

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Se não me engano, é óbvio que não, pois este post era único, fechamos a parte 1 com esses questionamentos:

  1. O que seria o marginal?
  2. Com que base é dada a alcunha de marginal a um cidadão?
  3. Qual a origem dessa palavra?

Diariamente escutamos em excesso as expressões ”marginais”, “marginalizados” e “à margem da sociedade”. Aproveitando-se  nelas, canalizamos nosso ódio e horror às classes mais pobres – o que nada mais é que uma condição secularizada imposta pela classe dominante. No entanto, devemos levantar uma questão:  será que o “marginal” opta pela  exclusão social?

A marginalização da pobreza em terras nacionais teve início após a abolição da escravatura, juntamente com o término do século XIX, embasados nas doutrinas nazistas racistas científicas. Obviamente, a escravidão criaria o grosso dos “marginaism, pois, tendo em vista que coexistimos em um país com aproximadamente três séculos de escravidão diversificada, essas são questões históricas que certamente não poupam nossa elite de rebolar em situações embaraçosas.

A categorização do indivíduo em “classes sociais”, destacando as incontáveis questões oriundas da produção da pobreza, evidenciam um  procedimento de segregação e exclusão, muito visto nas periferias. Essas condições somadas com a mínima possibilidade de subsistência cidadã e a aceitação de um “inevitável” destino, forçam-nos a perder a capacidade de controle, nos tornando alheios à história, ou seja, à “margem dela”. Dessa maneira, a falta de acesso aos bens materiais e símbolos da sociedade de consumo arrombam a ferida de alguns cidadãos que, geralmente, personificando a exclusão social, fomentam a cultura criminosa e abusiva.  Toda essa calamitosa situação, apoiada pela influente mídia burguesa, aos olhos dos cidadãos do “asfalto” (classe média tão precarizada quanto os da favela) mistifica a incansável guerra de classes, na qual os mais pobres são vistos como a classe perigosa.

Em Tropa de Elite, tão presente quanto, ou até mais, que as críticas, as cenas de violência e humor negro, também destoam do show de atuação, não só do excelente Wagner Moura, mas também dos demais atores principais, que indiferentes ao ritmo frenético imposto pelas filmagens não se acovardaram diante das lentes.

Em destaque, citarei os três atores mais marcantes ao meu ver e farei uma menção honrosa ao final.

Wagner Moura

A atuação realista de Wagner Moura deve ser definida com uma marcante palavra – espetacular. Depois desse filme, não consigo poupar elogios ao genial baiano, que, usufruindo de graça, emplacou nas entranhas de seu personagem a dicotomia de valores na questão da marginalidade. Há anos não bispava cidadão tão talentoso, dono de um carisma impressionante. Mesmo abusando de cenas violentas, o singular ator conseguiu cativar o espectador, que, cego diante de tanto talento, envolve-se no drama pessoal do delituoso, isentando-o de qualquer culpa.

Além da evidente aptidão para atuar, também me chamou atenção o ar assoberbado, mesmo em situações complicadas, que impressionantemente torna-se positivo. Alimentando uma veia intelectual que realmente tornou-se o seu charme diante das telinhas, se esse é um predicado utilizado pessoalmente por este notável ator, não posso dizer, mas, ao que me parece, trata-se mais de seus personagens, uma vez que sempre em contato com a mídia ele parece mostrar muita simplicidade.

Caio Junqueria

Sobre o distinto Caio Junqueira não tenho muito a dizer, até pelo motivo de sua metamorfose espiritual perfeitamente abrupta ter-me arrancado o fôlego. De maneira realista e um tanto simplista, o jovem ator aproveitou ao máximo o estilo genioso levemente declarado no início da trama, cedendo ao fim uma aura psicótica ao seu personagem que, de corpo e alma, entregou-se ao BOPE.  Em minha opinião, o momento mais marcante é quando o ator abdica de seu cabelo, propositalmente mauricinho, e fala esbugalhando seus olhos: “Caveira!”

Mesmo assistindo a excelentes atores em nossas telinhas tupi-guarani, poucas vezes me impressionei com uma mudança tão radical, parabéns Caio Junqueira! Uma pena que não o teremos na continuação…

André Ramiro

Outra bela atuação, propositalmente com menos destaque e frases de efeito. No entanto, com um peso espantoso por tratar-se de um iniciante que, há pouco, trabalhava como bilheteiro de cinema. André Ramiro demonstrou a razão pela qual fora chamado a compor tão adequado elenco. Possuidor de regularidade notável, o sóbrio intérprete também soube como incorporar o papel, e, utilizando-se da impassibilidade de cultuados nomes, também converteu seu personagem, destituindo-se da imagem de politicamente correto, quase “Caxias”, em prol das feições indiferentes de um amigo amargurado em busca de vingança. Literalmente o homem que encerrou a história.

Baiano

A menção honrosa fica para o ex-lateral e meia pela direita também eficiente Fábio Lago (fã da Chayene em Cheias de Charme) que, infelizmente, ganhou maior destaque ao ser atropelado na vida real. Quanto a sua atuação, posso afirmar que não deixou nada a desejar, personificando muito bem um personagem que, ao meu ver, foi mal construído. Não digo por suas inconstâncias psicológicas, pois acredito que essas foram propositais, objetivando evidenciar um homem temperamental e impiedoso. Contudo, seu personagem não demonstrava o devido respeito referente a hierarquia de sua  facção, sendo comparado a um marginal qualquer, embora o que mais  me incomodasse fosse a descaracterização do criminoso regional ao usar excessivamente de gírias paulistanas, algo que não credito ao  ator e sim à equipe criativa.

FIM.

Don Vitto

Escritor, acadêmico e mafioso nas horas vagas... Nascido no Rio de Janeiro, desde novo tivera contato com a realidade das grandes metrópoles brasileiras, e pelo mesmo motivo, embrenhado no submundo carioca dedica boa parte de seu tempo a explanar tudo que acontece por debaixo dos panos.

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