Falta de Criatividade: Origins

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Segundo Antoine Laurent de Lavoisier: “na natureza, nada se cria, nada se perde, tudo se transforma”. Frase amplamente conhecida e facilmente adaptável para outras áreas. Em entretenimento: nada se cria, tudo se copia. Há quem diga que todas as estórias já foram contadas e que vivemos em uma cultura do remix. Inclusive, recomendo dar uma olhada nos vídeos sobre este assunto clicando aqui, vale muito a pena. Sendo assim, novas obras são, nada mais nada menos, que adaptações de produções anteriores, sejam através de cópia escancarada, influência estética ou homenagem. E não há nada de errado nisso, faz parte do processo criativo.

Infelizmente, devido à ferocidade do mercado, faz-se tudo para que uma iniciativa gere lucro. Assim, em um curto espaço de tempo, obras que já conquistaram seus espaços são repetidamente utilizadas para auxiliar os novos empreendimentos. Ao invés de criarem novas sagas, com novos personagens independentes, cenários, enredo, antagonistas etc., os produtores e desenvolvedores se prendem fortemente às franquias que fizeram sucesso.

Típica situação de “finalizei a saga ou matei o herói. O que fazer para continuar lucrando? Rá! Origins…”. Essa tendência de “contar a origem” nada mais é que um artifício para vender mais utilizando fama já concretizada.

200px-Silent_Hill_Origins_-_North-american_coverChega a um momento que não dá mais. Chega. Acabou. Foi bom enquanto durou… São necessárias obras criativas inéditas, não mais Silent Hill: Origins, X-Men Origins, Batman: Arkham Origins, Rayman Origins, Final Fantasy Origins…

(de filmes, há Planeta dos Macacos: a origem, Tainá: a origem, X-Men Origens: Wolverine, A Terra do Nunca: a origem, Red Faction: Origins…).

E não precisa vir com Origins como subtítulo, basta ser uma tentativa de ser novo com base na origem de algo já velho… God of War: Chains of Olympus é um nome pomposo para contar a origem de Kratos.

God of War é um caso peculiar de cara de pau, pois além de possuir um título referente à origem do herói, ainda tem a coragem de lançar outro cuja cronologia vem antes do primeiro da série. O pior de God of War Ascention, em termos narrativos, é que não interfere em nada na saga de Kratos – é um novo jogo que se diz parte da saga geral, com o mesmo protagonista, os mesmos inimigos, a mesma mecânica, mas que, na verdade, é um spin-off muito vagabundo. A história não tem valor nenhum no desenvolvimento da saga do herói e não há referência em relação a ela em nenhum dos três jogos principais. Claramente possui a função de gerar lucro.

God of War Ascention é um Spin-Off: Origins…

Um exemplo de bom spin-off (não que o conteúdo da obra seja bom) é o Star-Wars-Clone-Warsdesenho Star Wars: Clone Wars. São 25 episódios que, cronologicamente, se passam entre o episódio II e III da trilogia de filmes principal. Nele, podemos ver como Anakin adquiriu a cicatriz em seu rosto (o personagem já começa A Vingança dos Sith com esta marca). É interessante porque demonstra planejamento; não é aleatório, pois se baseia em algo real naquele universo.

Silent Hill, depois de forçar a barra com o segundo e o quarto título da série (nomeando-os desta maneira, o que leva a uma interpretação de que fazem parte direta da cronologia dos eventos), se rendeu para o Origins. Felizmente, optaram por parar aí e entrar de verdade nos spin-offs. Entretanto, ainda são igualmente vagabundos, pois apesar de manter a mesma estética e clima de suspense, a única relação com Silent Hill é o nome da cidade onde os eventos ocorrem ou uma fraca alusão à lógica macabra do lugar como influência para novos acontecimentos.

Resident Evil, por sua vez, é um caso extremo e merece ser usado como exemplo de apelação, falta de criatividade e falta de compromisso com o original. Ao todo, a franquia é composta por 13 jogos: Resident Evil, Resident Evil 2, Resident Evil 3: Nemesis, Resident Evil Code: Veronica, Resident Evil Zero, Resident Evil: Dead Aim, Resident Evil 4, Resident Evil: The Umbrella Chronicles, Resident Evil: The Darkside Chronicles, Resident Evil 5, Resident Evil: Operation Raccon City, Resident Evil: Revelations e Resident Evil 6.275638dz

Apesar de acreditar que boa parte dos títulos compõe uma sequência (e se vende desta maneira), é, na verdade, spin-off. De fato, só existiram três, os lançados para Playstation 1. Tudo o que veio depois são jogos distintos que utilizam o mesmo nome. Diferente do que ocorreu com Silent Hill, em RE nem a jogabilidade foi mantida. De um survival horror puzzle passou para um “third person adventure shoot’em up”.

Inclusive, os filmes são socos na cara para qualquer fã da série original (até o RE 3, e olhe lá…).

O problema do desenvolvimento de jogos ou produção de filmes que contam as origens está no objetivo de garantir sucesso imediato com base em fama recentemente conquistada. Fugir da copia (influência) é impossível, mas jogar no mercado uma produção visivelmente ancorada na tradição é negar qualquer parcela de criatividade autoral. Se RE é um ótimo jogo, não significa que RE6 também será simplesmente por usar Leon Kennedy matando zumbis (e, de fato, não é). Aproveitar a origem de uma saga no desenvolvimento de um jogo não pode ser desculpa para continuar utilizando o nome da série.

Se Silent Hill 4: the room se chamasse Duque de Caxias: the room, muitos problemas seriam evitados.url

Gustavo Audi

Se fosse uma entrevista de emprego, diria: inteligente, esforçado e cujo maior defeito é cobrar demais de si mesmo... Como não é, digo apenas que sou apaixonado por jogos, histórias e cultura nerd.

Este post tem um comentário

  1. Excelente post, Audi! De fato, Silent Hill se perdeu depois da 2ª edição, Resident Evil passou a ser um pastiche de si mesmo, completamente irregular. A esses jogos, acrescento ainda alguns que, já sem personalidade, tenderam a piorar, como por exemplo Need For Speed e Bioshock.

    Need for Speed é sempre uma incógnita, a cada edição, nunca vi jogo mais sem cara. Aliás, a impressão que dá é que não há regularidade de equipe de criação do jogo. As mudanças de uma edição pra outra são excessivamente drásticas, como, por exemplo, a transição do Underground pro Most Wanted (melhora demais), pra depois cair na merda que foi o Carbon.

    Bioshock foi um jogo maravilhoso em sua 1ª edição, com ambientação primorosa e amedrontadora, no 2º, já teve uma pequena queda. O 3º Bioshock deixou o número pra trás e se chama Bioshock Infinite. Não joguei, mas parece que houve mudanças, e não pra melhor.

    Então, essas reciclagens acabam sendo tristemente previsíveis e desgastantes….

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