Filho bastardo da Marvel Comics com o roteirista Marketeiro Millar, Kick-Ass é uma espécie de The Big Bang Theory em que os personagens usam fantasias de super-heróis da Disney, não da Warner.
Mentira. Para ser minimamente caga-regra honesto, Kick-Ass foi uma minissérie em quadrinhos lançada entre 2008 e 2010, que apostou suas fichas na tragicômica trajetória de um fanboy de HQs que decide patrulhar seu bairro vestido como um super-herói.
A HQ, com desenhos de John Romita Jr. em estilo line art e roteiro inspirado de Mark Millar, utilizou realismo e violência plástica para retratar os desejos e frustrações de uma juventude sem grandes sonhos e ideologias, e, particularmente de um grupo identificado pela devoção à nona arte, que cresceu entre os cânones da cultura pop.
Ao quadrinho se seguiu o filme. Uma irretocável adaptação dirigida por Matthew Vaughn, que, se não foi tão bem-sucedida comercialmente como as demais da Marvel, certamente já se tornou cult, tendo como símbolo a sacana interpretação de Chloe Moretz como a Hit-Girl.
E, como introduzir a trama de Kick-Ass sem falar na Hit-Girl? Impossível. Uma garotinha de 11 anos treinada pelo pai desde a tenra infância para se tornar uma combatente do crime.
Nesse ínterim, a minissérie ganhou um segundo volume, adaptada para um novo longa, e a Hit-Girl ganhou uma minissérie solo, que (diacho!) ainda não li.
E eis que recentemente têm chegado às bancas americanas (ou algo muito próximo disso), as edições do terceiro volume de Kick-Ass, isto é, a terceira minissérie, cujo primeiro número o Iluminerds, esta consciência universal digressional e dissociativa, vorazmente devorou.
Tudo começa após os sangrentos acontecimentos mostrados no fim do Volume 2. Hit-Girl está no xilindró, aguardando que Kick-Ass e seus associados, os fantasiados do grupo Justiça Para Sempre, a resgatem.
O que para ela é apenas um plano de contingência, para eles, todavia, mostra-se uma missão impossível. É o que nos contam as primeiras páginas, à moda dos filmes de assalto, ou de fugas espetaculares, em que os envolvidos reúnem-se nas sombras, revisam meticulosamente os detalhes da ação, demonstram confiança, e vão à luta.
A primeira versão de Onze Homens e Um Segredo, com Frank Sinatra e Dean Martin, veio-me à cabeça, pelo climão de ação entre amigos, à margem da lei. Em poucas páginas, tudo se torna a típica comédia de erros que tem caracterizado a série, com a realidade batendo à porta dos fantasiados, que voltam imediatamente a suas vidinhas cotidianas nais quais se sentem mais seguros.
Tais páginas funcionam como verdadeira carta de intenções, que nos diz exatamente o que esperar desses proto-heróis e serve de deixa para que leitores ocasionais, interessados em super-heróis com poderes sobrenaturais e missões espetaculares, abandonem a revista de vez, evitando uma possível frustração que os levaria a se tornarem haters ensandecidos, influenciando adolescentes confusos a evitarem a HQ, matando de inanição os reizinhos na barriga de Mark Millar.
Vencida essa espécie de introdução, a trama se volta à rotina de Dave Lizewski, o Kick-Ass. É dado um update de sua vida com a agilidade de uma tuitada. Logo, o herói de roupa de mergulho e seu parceiro Ass-Kicker seguem a pista do responsável por uma onda de assaltos.
A sequência busca manter o costumeiro naturalismo impresso ao universo do personagem, na reação blasé\irônica das pessoas comuns aos fantasiados, no considerável esforço empenhado nos atos de vigilantismo – como entrar pela janela e arrombar uma porta – e no uso de objetos ordinários – como o celular para chamar a polícia.
O trivial continua sendo a base na qual se sustenta o belo conceito do Kick-Ass. Entretanto, a chegada da equipe de Centrífuga, um novo mascarado que resolve seu déficit habitacional se encostando na bat-caverna da Hit-Girl, promete.
Se a base de Kick-Ass é a trivialidade, sua força-matriz é a violência. Sobretudo gráfica, mas, em muitos e importantes momentos é sutil, percebida na interação entre os personagens, sugerida nos olhares, nas expressões, reflexo do mundo real que Kick-Ass se pretende retratar.
Sinto que essa violência virá, talvez decisivamente, desse Centrífuga. Ora, o atrevido aproveitador levou a esposa para o clubinho do Justiça Para Sempre, não parece se importar muito com as regras do lugar, e se mostra bastante desrespeitoso.
A interação do grupo com esse distinto senhor e a problemática resultante de seu desapego a regras e, quiçá, à liderança de Kick-Ass ainda não é mostrada nesse primeiro número. Ainda assim, lembrei da HQ The Boys, de Garth Ennis, especialmente no tocante ao frágil laço que une alguns “heróis”,e a uma nuvem de estranheza e esquisitice que parece pairar no ar.
Uma rápida – alguns diriam rasteira – leitura, sobremaneira divertida, termina com um gancho bastante chinfrim. Isso aponta para o fato de que os clientes do Sr. Millar, especialmente em Kick-Ass, gostariam de mais do mesmo, com alguns ohs e ahs aqui e ali, sem contar com todas as cenas massavéicas que forem possíveis de se obter sem o uso de superpoderes clássicos.
Dito isto, duas considerações são necessárias. A primeira é que o quadrinho lembra um dos hábitos mais recorrentes do Homem-Aranha. Isso só corrobora ao fato de que Dave Lizewski é a tentativa do Millarverse em atualizar o conceito do adolescente que vira herói (alguém aí disse Pony Parker?).
É duro dizer, por fim, que Batman desprezaria a homenagem que vira e mexe Kick-Ass tenta lhe fazer, reconhecendo de forma madura o nível a que jamais chegará como vigilante.
Nesta edição, a rasgação de seda se dá numa emulação da clássica cena de Bruce Wayne consternado em frente ao túmulo de seus pais. É possível que a obsessão pelo morcego seja uma tentativa do escritor de ridicularizá-lo, ao inserir seus cânones num momento impregnado de amargura e humor negro.
Apesar de tudo, a sequência se mostra uma das mais divertidas da HQ, soando como se um doentio Neil Gaiman escrevesse o Timothy Hunter dos Novos 52. Saúde.
Daqui a pouco leio!!!
Kick ass hq é uma merda
O primeiro filme é bem legal
O segundo é muito ruim. Só vale pela Mãe Rússia que é muito insana