Iluminamos: Superman – O Precursor

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Lançado em 1978, com direção de Richard Donner e estrelado por Christopher Reeve, o filme Superman contou com o roteiro de Mario Puzo, já famoso por ter emplacado dois grandes filmes seguidos: O Poderoso Chefão I e II. Em Superman, vemos pela primeira vez uma abordagem mais “humanizada” do nosso Super-herói. Aliás, nesse filme o herói é um dos alienígenas mais humanos que até então se tinha conhecimento (outro exemplo de alienígenas extremamente humanos e gentis seriam o belo Contatos Imediatos de 3º Grau, de Spielberg).

Desde o advento do Batman de Adam West (resposta em parte decorrente de um processo insidioso de estigmatização dos super-heróis na grande mídia norte-americana, em parte iniciada com o livro Sedução dos Inocentes, de Fredric Werthan), os super-heróis deixaram de ter um espaço mais realista e, paradoxalmente, humano no mainstream, resumindo-se a aparições caricaturais nos segmentos mais adultos de audiência e simplórios, quando voltados ao público infantil.

Bat-adam
AAAi, como eu tô bandidaaaa!

Mario Puzo, acostumado como estava em reverter com maestria personagens marginalizados ao gosto do grande público (vide a trilogia O Poderoso Chefão), recebeu a incumbência de fazer o roteiro do filme. Os personagens de Puzo costumam ser simultaneamente constantes e multifacetados. Don Vito Corleone, ao mesmo tempo em que é marginal, tem sua própria e inabalável ética, a qual ele levaria até seu túmulo quando necessário. Este personagem trafega com a mesma fluência pela truculência da vida alheia às leis instituídas pelo Estado de Direito e pela virtuose de ser aquele que não se esquece das suas raízes e preza todos os que lhe são caros com a honra devida, que, pra ele, vale mais que ouro. É com essa abordagem que Puzo narrará a vida do jovem Kal-El, desde o nascimento conturbado até a apoteose da descoberta de seus poderes, já na Terra. Tal enfoque acabaria sendo recordista de bilheteria e sucesso de crítica, sob a batuta também talentosa de Richard Donner.

Superman Begins
Da esquerda pra direita: Pierre Spengler, Mario Puzo, Richard Donner e Cristopher Reeve

As escolhas de Donner na realização do filme são quase sempre certeiras: tanto no visual clássico adotado para o uniforme do nosso cuecão (em consonância com o visual do herói nos quadrinhos de então), quanto em edição e fotografia. O diretor acerta ao valorizar os planos cheios, colocando quase sempre o foco no Super da cintura pra cima, tendo o escudo com o “S” frequentemente centralizado – ou quase – na tela. Ao mesmo tempo, Donner sempre filma Clark Kent de ângulos inusitados, geralmente pegando-o em um ângulo perpendicular ao foco do espectador, tentando mostrar, através da filmagem, o caráter esquivo do alter-ego do nosso herói.

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Notem como quase sempre se tenta centralizar o escudo…
perpendicular clark
E agora, notem como o Kent é muito frequentemente filmado em diagonal ao foco da câmera….

Além disso, temos soluções bastante criativas em efeitos especiais. O final da década de 70 viveu uma efervescência em criatividade na criação de efeitos especiais, Stan Winston, George Lucas, dentre outros, procuravam soluções criativas pra colocarem na tela seus delírios visuais. O resultado disso todo mundo viu na criação não só de Superman, como de E.T. – O Extraterrestre; Alien: O 8º Passageiro;  Indiana Jones, e, acima de tudo, Star Wars. No caso de Superman, tanto as sequências de voo (por mais que pareçam defasadas e esquisitas nos dias de hoje), quanto os momentos em que o Super demonstra sua força, apontam a incrível necessidade de se usar as mais variadas formas de efeitos possíveis, pra não causar cansaço ao espectador. No caso das sequências de voo, então, isso fica bem evidente. Tomadas em Chroma-Key são alternadas por voo real do ator por meio de cabos, além de bonecos voando à distância sobre maquetes. Muitas vezes, as três técnicas aparecem quase que consecutivamente numa mesma cena, através de duas ou três tomadas diferentes.  Essa alternância de uso dos efeitos especiais acabou se tornando bastante efetiva, a ponto de se  afirmar que “você vai acreditar que um homem pode voar”.

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Notem o Chroma-Key: é mais que evidente a sobreposição do ator no cenário. A ponto de se ver a completa diferença entre o padrão de azuis da cidade ao fundo e o padrão de azuis do uniforme…
teste com cabos
Teste, com dublê, de voo com cabos.

Outra tendência criada pela equipe de Richard Donner foi a de se colocar grandes atores em papéis coadjuvantes. Marlon Brando, que na época vivia seu segundo auge na carreira, decorrente do sucesso do Poderoso Chefão, foi escalado pra fazer uma “quase-ponta” no papel de Jor-El, enquanto Gene Hackman, também grande ator que vivia seu auge, por filmes como Operação França, seria um Lex Luthor histriônico, cínico e sempre interessante. Essa tendência seria seguida desde então, até os dias de hoje, em praticamente todos os filmes de super-heróis conhecidos: Jack Nicholson no Batman de Burton, Willen Defoe em Homem-Aranha, Ian McKellen em X-men, e assim por diante… A lista é infinita.

Além disso, como terminar o post sem falar de Christopher Reeve? Ainda não vi o Homem de Aço, mas acho difícil encontrar uma caracterização mais humana e definitiva. Christopher É o Superman. Enquanto Clark Kent, ele se mostra como um cara bobo, sempre curvado, com um repertório gestual vago e impreciso, olhar atordoado. A voz pequena, baixinha. Já o Super-Homem de Reeve é o símbolo da confiança: peito pra fora, olhar aberto, fixo e penetrante, voz firme e gestos sumários e precisos, num movimento de exteriorização certeira de toda a dualidade e complexidade escrita por Mario Puzo e filmada por Richard Donner.

Reeve
Notem como TODO o gestual muda. No caso do Kent: testa arqueada e enrugada, demonstrando insegurança, olhar perdido e vazio, ombros caídos. Como Super-Homem: olhar fixo, com um propósito, rosto sem rugas, indicando serenidade e segurança. Ombro ligeiramente avançado, demonstrando que está prestes a agir.

Portanto, o Superman de Richard Donner é um filme que faz parte obrigatória, necessária, da educação de qualquer nerd que ache que conhece Histórias em Quadrinhos. Pois, quem lê HQs e não viu esse filme não pode se considerar realmente um nerd de HQs: é basicamente o mesmo que se declarar fã de Guerra nas Estrelas e não ter visto o Episódio V. Pronto. Cagação de regra da vez.

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Colossus de Cyttorak

Detentor dos segredos da Mãe-Rússia, fã incondicional de jogos da antiga SNK (antes de virar esse arremedo, chamado SNK Playmore), e da Konami, Piotr Nikolaievitch Rasputin Campello parte em busca daquilo que nenhum membro da antiga URSS poderia ter - conhecimento do mundo ocidental. Nessa nova vida, que já conta com três décadas de aventuras, Colossus de Cyttorak já aprendeu uma coisa - não se deve misturar Sucrilhos com vodka, nunca!!!!

Este post tem 14 comentários

  1. JJota

    Alguém deveria passar este filme para os executivos de hoje em dia: “Estão vendo, seus filhos de uma *&#%? Uniforme clássico! Origem fiel! Coadjuvantes sem invencionice! E faturou! E é bom! Façam boas histórias e parem de botar a culpa na cueca por cima da calça!”

    Melhor cena? De ação, do tipo “PQP!!!!!!! É O SUPERMAN!!!!!”, é o resgate da Lois no helicóptero. Marcante pela atuação, é Gene tirando a peruca no final do filme e se apresentando: “Lex Luthor, a maior mente criminosa deste mundo!” Patético e hilariante.

    Já falei o que acho da atuação de Reeve: ele foi perfeito ao captar aquilo que considero a essência do personagem e passar não só a noção de poder como a confiança que o Homem de Aço desperta nas pessoas.

    1. Pois é. a cena de ação é foda. Ainda hoje, é uma boa cena… Agora, imagine pra quem nunca viu efeitos especiais como os de hoje, ser presenteado com o Super-Homem PEGANDO UM HELICÓPTERO! Com bastante dramaticidade e tomadas relativamente rápidas… Cara, aquilo é ótimo.

      A única coisa que eu realmente não gosto (e nunca gostei) é aquela nave que leva o baby-Kal-El. QUE PORRA MAIS GAY…. Aliás, o cenário de cristal de onde a nave do Kal-El decola é um pesadelo gay. Tudo muito over… Tirando isso, o filme fez bonito, e acredito que ainda faça, até hoje.

      Cara, aquela do Lex tirando a peruca é o máximo. Conseguem dar espanto com um movimento extremamente simples, como o de tirar a peruca. E, ao mesmo tempo, mostra todo o patético do orgulho humano. Tudo num mesmo gesto.

      Quanto ao Reeve, ele foi perfeito pois conseguiu fazer dois personagens quase que diametralmente opostos com igual habilidade. Não exagerou ou estereotipou em nenhum deles. Completamente verossímil. Aliás, o primeiro encontro do Super com a Lois, na sacada da casa dela, é foda. Ele mesmo sabendo que é o Super-Homem, demonstra toda a confiança em seu gestual sem ser prepotente ou ridículo. As pessoas nem imaginam o quão difícil é fazer isso…

      1. JJota

        O visual de Krypton foi pensado levando em conta dois pontos principais: a tecnologia baseada em cristais e passar a ideia de uma sociedade que evoluiu ao ponto da esterilidade. Note que tudo é branco (o que torna marcante os trajes dos rebeldes comandados por Zod, que se vestem de preto). Outro ponto levado em consideração é justificar a escolha de um ambiente inóspito e gelado para a Fortaleza da Solidão: ele lembraria o planeta natal de Kal-El.

        Observando desta forma, apesar de feio, acho que se justifica.

        A atuação do Reeve é, sim, a de um grande ator. Acho incrível que sua carreira não tenha deslanchado ou como o pessoal hoje paga o maior pau pra caras que ficam interpretando o mesmo personagem ad infinitum nos seus trabalhos, como o Robert Downey Jr. e o Johnny Depp. São carismáticos? Sim. São bons atores? Sim. Mas não estão mais construindo personagens, apenas se auto-parodiando na tela ou fazendo exercícios do tipo “Eu seri assim se eu fosse uma pessoa legal, não o fdp egoísta e egocêntrico que eu realmente sou na vida real”.

        1. Eu entendi a proposta visual de Krypton do Donner, acho que é coerente, sim, só que isso não significa que eu consiga achá-la bacana. Aquela nave-estrela do Super é completamente disco. Ninguém merece. hahahaha

          Concordo com tudo que tu falou da punhetagem que Downey e Depp (mais o Downey, na verdade) passaram a ser. Se você vir bem, até o Dicaprio e Brad Pitt se arriscam mais que esses dois….

          1. JJota

            De boa? Vejo muito mais evolução no Pitt e no Dicaprio como atores no que nos outros dois. Os últimos trabalhos do Depp me fizeram reconsiderar minha opinião de que ele seria o sucessor perfeito para o Heath Ledger como Coringa.

      1. toddy

        Era disso que eu tava falando quando ele ainda tava pensando em lançar o post! huahauhauhauha

  2. Marcelo Tinoco

    Ótimo post. Ainda hoje é o melhor filme de super-herói já feito.

    1. Obrigado, Marc! Não adianta rechear o filme de efeitos especiais se você não apelar pro lado humano: aquilo que é sensível, que comove, que toca no que há de aspirações comuns a todos nós, como o Jota frisou bastante também no post dele. Esse filme faz isso.

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