Para citar a solução, antes devemos pensar sobre o problema. São vários, admito. Entretanto, é possível resumir em apenas um: incompetência administrativa. Este conceito é bem amplo e envolve a incapacidade (consciente ou não) de resolver problemas. Um exemplo bem simples: temos um buraco na rua; a solução seria tapá-lo, mas a administração não consegue fazê-lo por diversos motivos (cumulativos ou não): falta de verba; recursos humanos; planejamento; interesse;, conhecimento técnico… O problema inicial (o buraco) deixa de ser a questão, pois sua solução é conhecida. Daí, a incompetência em solucioná-lo torna-se o ponto principal.
O que quero dizer é que quaisquer problemas da cidade se resolvem com uma gestão inteligente, honesta e interessada. Muitas das dificuldades que passamos (transporte, segurança, educação, urbanismo etc.) são reflexos de incompetência administrativa e não de “casos fortuitos”.
Dito o problema, vamos à solução. Logicamente, poderíamos dizer que para resolver este problema bastaria contratarmos (elegermos) pessoas competentes. Ilusão. Os indivíduos no poder são extremamente competentes; afinal, desviar dinheiro público ou convencer milhões de cidadãos de quais são as boas escolhas não é fácil. A construção de discursos alienantes requer profundo conhecimento político, social e psicológico. Além disso, gerir uma cidade/Estado, mesmo porcamente, necessita de noções organizacionais.
Por que, então, se eles possuem potencial competência não a colocam em prática?
Privilégios.
Começa com aquele discurso de que o povo brasileiro é pobre, sofredor, humilde, batalhador, e, a partir daí, justifica-se qualquer medida compensatória. É a doutrina do “eu mereço”, do “é a minha vez” e, a mais nojenta de todas: a do “sempre foi assim”. Com a desculpa de que sofreu muito na vida, ao conseguir algo concretamente superior, o cidadão se acha no direito de evitar o estado “inferior” em que vivia. É o trabalhador que passou em um concurso público e se dá o luxo de não trabalhar mais (“eu mereço”); é o motorista preso no engarrafamento que se adianta utilizando o acostamento (“é a minha vez”); e é o deputado recém-empossado que não trabalha quintas e sextas (“sempre foi assim”).
O que estraga a gestão pública é a porcaria da generalização da imunidade. O que deveria ser uma prerrogativa para a correta execução do mandato, protegendo o parlamentar contra abusos e violações, transforma-se em um conjunto de regalias que destaca o representante daquilo que ele representa. São privilégios criados para os ocupantes de cargos públicos que o distanciam da realidade que os colocou lá.
É a droga do helicóptero do governador; do elevador privativo do prefeito; da ajuda de custo dos deputados; do plano de saúde dos senadores; das diárias, compensações, ajudas, adicionais, rubricas, bolsas, motoristas, placas brancas, seguranças, três meses de férias, batedores…
Tudo isso cria um mundo à parte. Uma pessoa que não vive na cidade não consegue objetivamente geri-la. É impossível entender totalmente uma dinâmica social sem ter passado pela experiência.
O pior disso tudo é saber que mesmo tendo passado por dificuldades e saber como é ruim, aqueles que “subiram de nível” se orgulham dos privilégios que ganharam. O cidadão comum (o coitadinho do trabalhador) se transforma em um magnata.
O magnata, então, resolve a sua vida escrota de cidadão transformando-se em uma exceção. Ele não precisa (e não quer) lutar por direitos gerais, pois já possui garantida a educação (através de auxílios), o transporte (através de passagens aéreas, motoristas e estacionamento livre), a segurança (através de guarda-costas), a saúde (através de planos particulares e auxílio médico), a moradia (através de apartamentos funcionais e auxílios), a alimentação (através de cartões corporativos) e por aí vai…
Entendo que alguns cargos exigem um tratamento diferenciado em função de sua natureza. Mas nada, nada mesmo, justifica transformar preceitos básicos de cidadania em regalias corporativas exclusivas de uma minoria.
A solução, portanto, para resolver a cidade é trazer nossos representantes de volta à realidade; é fazê-los sentir a cidade como ela realmente é. Vamos retirá-los de seus carros blindados pilotados por terceiros e colocá-los dentro de um ônibus quente, cheio, barulhento, perigoso e cujo itinerário não foi estrategicamente definido. É preciso lembrá-los que o Brasil não é o discurso fantasioso utilizado para convencer a Fifa…
Considerar a cidadania como um direito básico do cidadão e não um privilégio dos ocupantes de cargos públicos é o primeiro (mas não único) passo do processo de transformação deste país em algo minimamente digno.
Só li verdades!
E é isso que entristece, não é…?
Realmente. Recentemente, recebi uma imagem no facebook que achei perfeita: Você é contra a corrupção? Então não roube!
Infelizmente, muita gente acha fácil apontar o dedo para os erros dos outros. Uma vez que aparece a tão famosa ocasião…