Iluminamos: “Histórias e Bicicletas – Reflexões, Encontros e Esperança” (Oficina G3)

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Continuando minha obsessão atual por Oficina G3, resolvi aproveitar o embalo e escrever também sobre o trabalho mais “fresco” do grupo. Aliás, começando pelo título, tudo é meio “afrescalhado” neste novo disco. Se, como escrevi na crítica anterior, Depois da Guerra (DDG), de 2008, continha uma gostosa dualidade entre secularidade e evangelismo, dessa vez a banda preferiu não deixar dúvidas quanto a sua orientação e entrou fundo no proselitismo religioso, inclusive regravando “Aos pés da cruz” (um autêntico hino protestante do ícone do gênero Kleber Lucas) – verdade seja dita, essa é uma versão rock’n’roll, mas não deixa de ser um “canto de adoração”.

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Alguém precisa avisar pro menino que esse cabelo “tá feio, tá ridículo, tá escroto”, como diria a ídola Luane Dias

Não só as letras, mas a própria sonoridade da banda mudou, do vinho pra água, se me permitem o trocadilho. Com uma levada poprock, com alguns resquícios da verve progressiva que lhes deu fama, em “História e Bicicletas…” sai o peso e obscuridade atribuída pela dupla de produtores Marcello Pompeu e Heros Trench, e entra certo refinamento, leveza e, por que não, paz de espírito. Este novo velho estilo – lembrando que a banda já teve uma fase assumidamente poprock nos tempos do vocalista PG – guarda certa semelhança com o som da banda inglesa Muse (ou seja, um progressivo “mais comercial” ou um pop mais técnico, como preferirem). Aliás, esse poderia até ser um reflexo involuntário de “Histórias e Bicicletas” ter sido de fato gravado em Londres.

Neste disco, voltam as baladas, os backing vocals guturais dão lugar aos vocais sussurrados, as guitarras com afinação lá embaixo deram lugar aos violões e a um tecladinho com pouca criatividade (isso em termos de progressivo, claro, e excetuando algumas faixas). É quase como se a banda tivesse se arrependido de sua maravilhosa criação, o DDG, e quisesse retornar aos braços dO Senhor depois de um período de afastamento. Seria, então, o álbum de 2008 o monstro do Dr. Frankenstein? Estaria a banda, tal qual o perturbado doutor, tentando apagar os rastros de sua mais brilhante (e terrível) criação ou seria esse apenas mais um passo na “multifacetada” carreira da banda?

Crédito Ivo Sakihara
Crédito – Ivo Sakihara

Nem tudo, porém, está perdido, jovem headbanger, eles guardaram pelo menos uma carta na manga. E esta cartada é “Não Ser”, o ás de copas do CD, uma faixa muito bem produzida que traduz muito bem o estilo da banda e aproveita o melhor das aptidões individuais de cada integrante: linhas de baixo envolventes acompanham uma bateria imponente que se faz ouvir e é responsável pela identidade da canção, contrastando com uma guitarra no melhor estilo hard, sem muitas firulas, e com bastante peso, tudo isso coroado por vocais ora cantados ora rasgados – as únicas lembranças do DDG, poderia se dizer – e um teclado com uma afinação “organística” que, contra todas as possibilidades, combina muito bem com o conjunto da obra. Um espetáculo!

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Outras faixas de destaque são “Compartilhar”, “Água Viva” e “Diz”, essa um hardcore “meio porradeiro” que, confesso, quase me enganou (se não fosse uma “música da igreja” eu diria que é ideal para um rodinha punk das mais virulentas, com pé na porta e soco na cara – do jeito que eu gosto…). Além delas, “Confiar”, a música de trabalho, começa como balada, vai engrossando um pouco, mas é praticamente um Creed melhorado. E como tal, tem uma letra meio grudenta, difícil de sair da cabeça e quase impossível de não cantar junto.

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Ainda assim, é preciso dizer que esse trabalho só comprova a versatilidade da banda e a variedade do repertório musical que eles conseguem suscitar, entregando sempre uma qualidade acima da média. É um frescor muito bem-vindo a cena metal, fugindo daquelas composições que têm praticamente uma mesma “fórmula” e que, passando da música 1 até a 15,  parece que se está ouvindo a mesma música por uma hora e meia.

Fora isso, só quem acompanhou o sofrível esforço de Juninho Afram acumulando as funções de guitarrista e principal vocalista em 2005, em Além do que se vê, pode mensurar a contribuição de Mauro Henrique para o grupo. Aproveitando o tom mais “eclesiástico” do CD, sua interpretação pras músicas está continua, cheia de uma emotividade que não pode ser descartada do rock dito pesado, é um dos principais diferenciais da banda. Ele sem dúvida é “cantor de igreja” (e isso não deve ser visto como negativo em si, afinal, Beyoncé, Tina Turner, James Brown, Aretha Franklin, entre outros, também o eram) e, a cada lançamento, demonstra um grande potencial a ser desenvolvido, especificamente na área do metal, podendo se tornar uma futura referência do gênero.

Em suma, “Histórias e Bicicletas (Reflexões, Encontros e Esperança)” é um trabalho bem interessante que têm refrões empolgantes, riffs bem trabalhados e tecnicamente indefectíveis, mas não vai revolucionar o rock nacional como o conhecemos.

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Realmente, canta muito, mas que está parecendo o Wolf Maia, isso tá.

Olha só, cá estou eu novamente comparando os dois trabalhos, como se isso fosse a única interpretação viável do álbum. Claro que algumas comparações não são justas, mas é por isso que digo que não sou um critico musical per se, muito pelo contrário (aliás, nem sei o que é uma oitava). A verdade é que aqui no Iluminerds somos todos especialistas, não nas áreas que nos propomos a comentar, mas em retórica barata, aquela que utilizamos a todo o tempo na construção dos discursos. E é por isso que somos todos grandes cagadores de regra.

Zé Messias

Jornalista não praticante, projeto de professor universitário, fraude e nerd em tempo integral cash advance online.

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