Sou Geese Howard, na luta te esculacho.

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Ao contrário da Capcom, que, em seus jogos de luta, segue a tática do “vai-que-dá-certo” no que diz respeito à criação de personagens, a SNK, desde a criação de seu ramo de games até sua falência (sim, falência, pois essa porcaria chamada SNK Playmore nada mais é do que o equivalente, no mundo do videogame, àquelas coletâneas caça-níqueis de grandes músicos, de “Os 10 ou 20 maiores sucessos”), seguiu uma forte tendência de criação de personagens focados em função de uma história.

O conceito dos criadores dos jogos à época era: já que vamos fazer um game de porrada, vamos criar uma história melhorzinha como diferencial. Aliás, a história, nestes jogos de luta, era executada de maneira bem eficiente. Tão eficiente que se fazia vista grossa até mesmo a plágios de personagens de outras empresas, como era o caso do Ryo Sakazaki, da franquia Art of Fighting, nada mais do que, a princípio, uma cópia genérica e pifiamente realizada do Ryu do Street Fighter 2.

A princípio, os dois personagens eram extremamente parecidos. Ao longo do tempo, foram criadas mudanças tanto nos golpes quanto em magias e na postura de luta, que, finalmente, os deixaram distintos

Não é à toa, portanto, que a SNK criou tantas franquias bem sucedidas de jogos de luta, o conceito de “porrada com história razoavelmente decente” foi bem sucedido e a SNK o explorou à exaustão. Provas, nesse sentido, não faltam: só no começo da década de 1990 foram quatro jogos seguidos, todos virando franquias extremamente bem sucedidas: Art of Fighting, Fatal Fury, Samurai Shodown e The King of Fighters. Essa linha de jogos prosperou tanto que, em meados da década de 1990, o nome SNK basicamente virou sinônimo de “jogo de luta bom pra cacete”.

No auge da criatividade em histórias e jogabilidade em jogos de luta, a SNK criou aquele que, a meu ver, seria o grande nêmese da empresa: Geese Howard.

Real-Bout-Geese

Geese Howard, pra mim, está pra SNK como Darth Vader está pra George Lucas. Mas por que esse personagem ficou tão notório, virando o equivalente máximo do tiziu-cramulhão-coisa-ruim-belzebu-capeta no reino dos games de luta?

No post anterior (você pode ver esse tal post anterior aqui), em que fiz uma introdução a respeito do King of Fighters, falei do K’, personagem sem sal da franquia. Disse, ainda, que nessa série, a SNK inaugurou uma linha narrativa entre todos os jogos da empresa, criando a noção de “universo integrado”, coisa comum aos gêneros folhetinescos e onipresente nas HQ.  O esboço deste universo integrado se deu em duas séries de games de luta da SNK: Art of Fighting e Fatal Fury, estando as histórias dos dois jogos bastante ligadas. De fato, na linha cronológico-narrativa das franquias, o segundo Art of Fighting se passaria 10 anos antes da primeira edição de Fatal Fury, e adivinhem quem é o elo entre as duas franquias? Exatamente, nosso vilão fodástico. Geese Howard era o grande chefe escondido do final de Art of Fighting 2. Ao ganharmos todos os lutadores do jogo, sem perder um round, e após enfrentar o chefe final, Mr. Big, descobrimos que o grande mentor do sequestro de Yuri Sakazaki, irmã de Ryo Sakazaki,  é um ambicioso e maquiavélico comissário de polícia, chamado…? GEESE HOWARD! OHHH!

Geese Art of Fighting 2
Como chefe escondido do Art of Fighting 2, e sendo 10 anos mais novo, Geese Howard está mais almofadinha do que nunca e no ápice de sua forma física. Ganhá-lo, meus amigos, é extremamente complicado
Geese vs. Takuma
Notem o sorriso diabólico do homem, enquanto ele dá um chute na cara do Takuma… O safado teria sequestrado a filha de Takuma pra forcá-lo a trabalhar pra ele…

Como senhor de todos os males, não contente em sequestrar Yuri, sendo o motivo para a história de dois jogos seguidos – Art of Fighting 1 (o resgate de Yuri) e Art of Fighting 2 (a busca pelos culpados do sequestro de Yuri) – pouco tempo depois, Geese irá assassinar um de seus antigos rivais. Trata-se de Jeff Bogard (Tung Fu Rue, o mestre, ensinou a ambos as técnicas do Hakkyokuseiken, matar Jeff seria a prova definitiva da supremacia de Geese), pai adotivo dos irmãos Bogard, despertando a ira dos jovens Terry e Andy. O fato cria o plot pra vingança dos dois na série seguinte: Fatal Fury. Portanto, além de mal e inescrupuloso, o cara provocou a ira de meia-dúzia de lutadores hiperpoderosos, matando ou sequestrando seus entes queridos, e, pra completar, foi oficialmente o primeiro anfitrião do torneio King of Fighters. Sim, o cara sozinho é o vilão de praticamente 3 franquias de sucesso. Não dá pra ficar mais FDP que isso.

fatal-furya_thumb[2]

Por que diabos Geese Howard implicava tanto com lutadores ou mestres de dojôs? Além de querer ser o dono de South Town, sua cidade, tanto do lado da lei quanto do submundo – ele deixou de ser comissário e ficou milionário com suas tramoias escusas e ligações com a máfia. A megalomania do sujeito o levou a querer ser também o lutador supremo de todo o universo. E, pra isso, tinha como diversão sádica espancar outros lutadores, dominar e matar mestres de técnicas de luta exóticas. Graças a isso, ele financiava torneios de luta (como o primeiro King of Fighters, que foi a essência do primeiro Fatal Fury) e ia praticar o seu hobby de espancamentos extremos, indo nas academias e dojôs, encher o saco dos respectivos mestres.

O cara era tão ruim, mas tão ruim, que até a morte ele enganava. Ao final do primeiro Fatal Fury, ele é jogado do alto de sua cobertura, a Geese Tower (sim, o megaegocêntrico tinha a sua Trump Tower). No final de Fatal Fury 2 Special, descobrimos que ele conseguiu escapar e forjou a própria morte e, no final de Real Bout Fatal Fury, 5º jogo da série, ao despencar de novo de sua cobertura, recusa ajuda dos irmãos Bogard, vindo realmente a cair. Qual não é a surpresa ao vermos que o vilão ressurge no Real Bout Fatal Fury Special, com a identidade de Nightmare Geese, uma aura roxa e poderes sobrenaturalmente amplificados?

Nightmare Geese

Geese Howard é, portanto, o bully supremo do mal. Frio, calculista, megalomaníaco, egocêntrico, traiçoeiro, orgulhoso e desmedidamente ambicioso. Sua busca pelo poder vai permear sua aparição em várias franquias da empresa: em Fatal Fury 3, ele sai à procura dos pergaminhos secretos Jin, que dariam ao seu possuidor força e poderes sobrenaturais. No King of Fighters ’96, ele se junta ao seu antigo capacho, Mr. Big e ao rival e meio-irmão Wolfgang Krauser, e busca se apoderar do poder de Orochi.

A meu ver, Geese é um dos grandes vilões de games de luta pois é a essência do mal. E, como o Mal, ele sempre volta, qual a fênix, que ressurge das cinzas. Essa analogia, inclusive, figura ao longo de vários jogos: geralmente, a luta contra este vilão se dá em cenários que ora possuem elementos em chamas, ora estão completamente em chamas. Além disso, na grande maioria das vezes, seus cenários exibem imagens de fênix, sejam pintadas em algum detalhe da locação, sejam no chão ou em tapeçarias orientais. Fica bem claro que o vilão se identifica com os elementos do fogo e das cinzas, tal identificação só reforça aspectos da psicologia megalômana do personagem, mostrando a crença exagerada na própria imortalidade e no seu poder.

Por todos esses elementos, e pelo fato de a SNK mostrar como um personagem pode ser fabricado não só a partir do que está nele, mas pelo seu contexto, pelo que é construído nesse mesmo contexto, e como o personagem aí interage, é que entendo que Geese Howard é um grande vilão dos games. Pronto, caguei minha regra. Housy, pode me limpar…

Toma, to-toma, to-toma, toma…

Colossus de Cyttorak

Detentor dos segredos da Mãe-Rússia, fã incondicional de jogos da antiga SNK (antes de virar esse arremedo, chamado SNK Playmore), e da Konami, Piotr Nikolaievitch Rasputin Campello parte em busca daquilo que nenhum membro da antiga URSS poderia ter - conhecimento do mundo ocidental. Nessa nova vida, que já conta com três décadas de aventuras, Colossus de Cyttorak já aprendeu uma coisa - não se deve misturar Sucrilhos com vodka, nunca!!!!

Este post tem 19 comentários

  1. Vilipendiador Unperucked

    Este foi a minha primeira opção de vilão no podcast de vilão dos games. Sempre achei o personagem extremamente rico e diferente. Até seus golpes eram originais: magia dupla e aquele agarrão demoraram para serem copiados por outros lutadores de games.

    1. Vilipendiador, realmente o Geese é um vilão único, de primeira categoria. Assim que tinha acabado de escrever o texto, lembrei justamente dos golpes que você falou, mas achei que o texto ia ficar grande demais, e acabei desistindo de entrar nesses detalhes…
      Mas, tanto o Double Reppuken dele (a magia dupla), quanto o Atemi Nage, que é o agarrão que você falou, eram golpes inéditos. O Atemi Nage, que se usa como contra-ataque, foi, desde a criação de Geese, golpe original dele, depois copiado por meio-mundo. Além disso, esse golpe também dá uma amostra da personalidade traiçoeira do Geese Howard. Ele é um exemplo perfeito de personagem que diz tudo por seu contexto e seus golpes (que são os atos dele).

      Grande abraço!!

  2. toddy

    Rapaz, eu lembro que art fighting 2 foi o primeiro game de luta que eu ganhei no meu super nintendo e quando meu primo falou dessa historia do geese, eu fiquei louco joguei a noite toda só pra abrir esse personagem, o cara era muito ladrão, quase impossível de se ganhar, bons tempos! E só faltou você falar do filho dele, O Rocky Howard, o qual o Terry criou né! ótimo post
    Colossus de Cyttorak! valeu

    1. Cara, eu soube da história do Geese Howard escondido por meio da revista Ação Games (inclusive, tenho uma coleção enooorme dessas revistas lá na casa dos meus pais até hoje)!!! Quando soube, fiquei acho que o dia inteiro tentando, até finalmente conseguir fazer com que o filho da puta aparecesse, me ganhando logo em seguida, de forma vergonhosa.

      Pra ganhar dele, tinha que ser no macete, não tinha outro jeito. Não lembro mais como se faz, mas eram 2 séries de golpes que tu poderia usar: uma pra se atacar ele no chão, e outra pra contra-atacar, quando ele vinha pra cima…. Muitíssimo difícil, até descobrir isso…
      Quanto ao Rocky, eu não falei sobre ele, assim sobre outras coisas, pois achei que o post ia ficar grande demais, e ia fugir um pouco do assunto. Mas como tô escrevendo uma série de posts sobre os tempos de SNK, acredito que isso venha acabar acontecendo…

      Obrigado pelos comentários constantes nos meus posts, Toddy! Grande abraço!

      1. toddy

        Putaqpariu pra ganhar desse viaduuu tinha que ser no macete e pior se tua perdia pra ele, não tinha o continue eu acho, o que tornava o cabra ainda mais dificil!

        1. Realmente, só se podia perder pra ele uma vez… Era muito ruim. Além disso, os golpes dele tinham um campo de alcance enooooorme! O soco tinha um raio de ação de 180º em volta da mão dele… Se você viesse na voadora, no momento que ele tava dando o soco, tu perdia a vez, tomava a porrada, e, se bobear, ainda tomava algum outro golpe ou magia na sequência. UMA MERDA!

  3. MaxRicardi

    o chefe mais filho da puta do mundo, no AOF2 e no KOF Neowave

    1. Nem diga. Aliás, Geese era o chefe mais filho da puta que existia no mundo SNK. Sempre que aparecia, era de uma apelação sem noção. Infelizmente, isso se acabou quando os personagens da SNK passaram pras mãos da CAPCOM nos jogos crossover (Capcom vs. SNK), ou quando saíram pra Eolith/SNK Playmore…

      Grande abraço!

    1. Não só no Real Bout, mas em todos os jogos em que aparecia… Aliás, a impressão que dá é que ele foi realmente criado pra ser o Ultimate Motherfucker. HAHAHAHAHA

  4. Venerável Victor Vaughan

    Show ler essa matéria, poderoso Colossus, putz, voltei muito no tempo, de forma muito legal com seu texto e olha que não sou nem um pouco saudosista, mas bateu saudade agora! Continue sendo esse bom redator e campeão de Cyttorak!!!

    1. Muitíssimo obrigado pelo “poderoso”! Não mereço, mas agradeço muito o elogio. Com certeza, a ideia na hora de escrever esses posts, é tentar fazer com que todos sintam, da maneira de cada um, o que eu sentia quando jogava loucamente esses jogos, às vezes por dias seguidos… E passar isso de maneira saudável e saudosa, sem ser com aquele tom de lamento do discurso do “oh! aqueles dias que não voltam mais!”

      Desejo o mesmo pra você, Venerável, pois seus posts também são bons demais de se ler.

      Grandes abraços!!!

  5. Respondendo novamente ao Luciano Gardner: realmente, o Geese Howard de KOF ’96 é uma aparição equivocada. O que eu soube, foi que a equipe de produção de KOF ’96 não sabia o que estava sendo preparado pro Geese no Real Bout, e, apesar dos avisos, fez questão de usar o personagem mesmo assim. Inclusive, se você reparar, o Geese Howard que aparece ali é o mesmo do Fatal Fury 3, negligenciando totalmente as mudanças que foram impostas ao personagem na série Real Bout, que foi posterior.
    Além disso, de fato, Geese se aliar a Krauser em KOF ’96 também é acatamento ao que foi colocado no segundo anime da franquia.

    Muito obrigado pelos comentários e abraço!

    1. Luciano Gardner

      Sempre que você postar sobre a minha empresa favorita estarei pra comentar! É com muito saudosismo que me lembro dos tempos em que eu esperava um novo KOF ansiosamente, ou continuações de boas franquias tipo Metal Slug ou Samurai Showdown! Uma pena que não saiu uma continuação de Garou: Mark of the Wolves!

      1. Cara, eu era igual a você. Ficava ansioso com as novas edições dos meus jogos favoritos.

        Acho que a continuação do Garou só não decolou porque a SNK faliu mesmo… Uma continuação seria inevitável. O jogo tinha tudo pra ser uma nova franquia de sucesso da empresa. Inclusive, esse será tema de um dos meus futuros posts.

        Grande abraço!

        1. Luciano Gardner

          Esperarei ansiosamente por esse post! Abração!

          1. Colossus de Cyttorak

            Cara, saiu o post no Iluminerds sobre o Garou: Mark of The Wolves. Dê uma lida lá. Grande abraço!

  6. eu e um amigo sempre ríamos como o geese escapou da queda da geese tower (na nossa versão é claro): ele foi caindo, caindo, caindo e quando que estava a uns 3 metros do chão… Shippukken! e saiu andando tranquilamente, entrou numa limousine e foi embora, de boa. a SNK nunca será esquecida pela quantidade de jogos de luta maravilhosos que criou. Samurai 2 e KOF 95 são simplesmente insuperáveis na minha opinião.

    1. Alan, essa ideia é boa! HAHAHA! Você falou e eu praticamente vi a cena acontecendo, na minha cabeça. Um estilo bem anime/mangá pra se safar dos problemas! Quem sabe não foi assim mesmo que ele conseguiu fugir???

      Quanto aos seus jogos favoritos, concordo com o que você disse. Realmente, Samurai 1 e 2 foram feitos com a mesma engine gráfica e jogabilidade, que foi mudada do Samurai 3 em diante. Entre Samurai 1 e 2, concordo que o 2 é o melhor. Já, no geral, prefiro o Samurai 5, que é um Samurai 4 melhorado, já que o Samurai 3 tinha muitos furos inacreditáveis na jogabilidade que foram depurados na 4ª edição do jogo.

      Aliás, em breve escreverei um post sobre a série Samurai Shodown sob o ponto de vista do Haohmaru.

      Quanto ao KOF, como falei anteriormente, meus preferidos são o 98 (versão perfeita da engine usada até o 97), ’04 (versão perfeita da engine posterior) e o XIII, que é atípico.

      Obrigado pela leitura do post e abraço!

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